Ruivas, Louras & Morenas

sexta-feira, 18 de maio de 2007

É conhecida a fama de chauvinista gozada pelo francês. É também reconhecido o hábito do português se queixar constantemente de que somos pequeninos, e que lá fora é que é bom. E no entanto, nestas coisas da cerveja, os papéis invertem-se completamente. Quantas vezes já não ouvimos nós dizer a um amigo que “A nossa cerveja é considerada uma das melhores do mundo”? Quantas vezes vimos apregoadas medalhas ganhas pelas nossas cervejeiras? Neste último caso, acontece nunca ter percebido bem que entidades são estas que atribuem tais prémios, ou a sua credibilidade. Já quanto à afirmação patriótica, vejam só o que um crítico estrangeiro insuspeito diz relativamente à Super Bock:
- "Esta portuguesa tem uma espuma efémera. O seu aroma surpreende, mas não no bom sentido: por detrás de um malte ligeiramente torrado, escondem-se notas de cloro, bastante nítidas quando se deita a cerveja no copo. Este odor pouco agradável, sente-se igualmente no gosto. Muito pouco agradável!
Enfim, um dia ainda me hão-de explicar o que fazem xarope de glucose e antioxidante numa cerveja."

Como se vê, muito pouco lisonjeiro, para mais, apregoando a cervejeira proprietária, que esta é a cerveja mais vendida no País. O que a ser verdade, não abona muito em favor do nosso paladar. Devo acrescentar que o mesmo crítico é bastante mais benévolo em relação á Tagus, e quando chega á classificação, numa escala de 1 a 10, atribui 2 à SB e 5 à Tagus.
Considero que na comparação com a cerveja que se faz noutros países, nomeadamente Bélgica, França,, Alemanha ou Grã-Bretanha, só para citar países europeus, ficamos realmente a perder e largamente. Não direi o mesmo em relação a Espanha, o fosso não será tão acentuado, mas até aí, parece estar-se a evoluir no bom sentido. Passo a explicar: penso que as grandes cervejeiras por cá, são como um grande eucaliptal que seca tudo á sua volta. Aparece uma pequena cervejeira e de pronto se tenta o sua sufocação, talvez graça a uma lei de mercado que não protege o pequeno produtor. Creio que o que tem tornado o mercado cervejeiro belga reputado em todo o mundo - distinção que merece inquestionavelmente - é a existência de uma quantidade enorme de micro-cervejeiras, em grande parte familiares, das quais saem produtos de qualidade extra. A França, país vinícola por excelência, mas que nem por isso menospreza o sector cervejeiro, vai pelo mesmo caminho. E a Espanha, lentamente, faz o mesmo.
Cá é o marasmo, são sempre os mesmos. Lançam-se um refrigerantes de sabores vários e apelidam-nos de cerveja (por vezes até penso que os cervejeiros lusos levam à letra aquela fábula que contam sobre o velho Pereira da Fonseca que terá dito para o filho no seu leito de morte:“Lembra-te meu filho, que até das uvas se faz vinho“). Isto é, variedades há, mas qualidade...Mudam-se as garrafas, inovam-se os rótulos - o que não está mal - e pensa-se que tudo mudou. Como diria o Giuseppe de Lampedusa “É preciso que algo mude, para que tudo fique na mesma ”. Parece-me a mim muito particularmente, é que seria na diversidade das fontes que estaria o segredo do progresso (louve-se aqui, algumas iniciativas inovadoras por parte da República da Cerveja).
Não penso no entanto que tudo esteja mal. Veja-se o caso da Sagres Bohemia que me parece ser uma cerveja ruiva muito bem concebida - é a minha cerveja nacional preferida - e equilibrada: boa espuma que se mantém razoavelmente, carbonatação no ponto certo, aroma e paladar agradáveis e que aguentam bem algum excesso de refrigeração com que por vezes é tirada, no caso de ser cerveja de barril. Uma cerveja que demonstra que por cá também se conseguem artigos de bom nível.


**********



- Quando referia o chauvinismo francês, lembrei-me que por França, em qualquer bar ou restaurante em que se entre e se peça cerveja a copo, há sempre duas ou três marcas - principalmente da Kronenbourg -, mais uma Grimbergen ou outra belga qualquer em alternativa. Por cá, quem quer uma “imperial”, não sei se encontrará local onde a SB e a Sagres coabitem. Cerveja estrangeira de barril então, é como procurar agulha num palheiro. São os tais proteccionismos que se não entendem e que só resultam em acomodações pouco recomendaveis e com as quais o consumidor nada beneficia.

Etiquetas:

 
posted by Vic at 5/18/2007 09:00:00 da manhã |


0 Comments: