Ruivas, Louras & Morenas

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Um dia, um amigo meu confessou-me, com uma alegria esfusiante estampada no rosto, que as suas férias de sonho estavam quase a tornar-se realidade. Imaginei então que me diria a seguir que lhe tinham oferecido uma viagem às Seychelles ou Maldivas. Puro engano!
- Vou a Reims! Vou a Reims! Convidaram-me para passar 8 dias numa das melhores caves de champanhe de Reims! Já viste a minha sorte?!
Fiquei espantado! Mas logo ponderei e verifiquei de que a minha estranheza não tinha razão de ser. Afinal, ele sempre se afirmara um apaixonado pela estupenda bebida francesa, e lia tudo o que lhe vinha às mãos que a referisse, mesmo que ao de leve. Fácil portanto de entender que, para ele, aquele local para onde ia, fosse um dos paraísos sobre a terra.
Quando chegou, escreveu-me um postal ilustrado com uma fotografia panorâmica da cidade. O texto era curto: “Isto é orgásmico!”
Analogamente, acredito que para o amador cervejeiro - aqui a palavra refere-se naturalmente a “apaixonado”, ou “amante” - deslocar-se a Bruxelas e sentar-se ao balcão do Delirium Café lhe trará uma satisfação quase idêntica à que aquele meu amigo experimentou no dia da sua chegada às referidas caves.


Com efeito, uma pessoa para quem degustar uma boa cerveja - novidade, de preferência - constitui um dos prazeres da vida, chegar a uma cervejaria que lhe oferece uma “carta” com mais de 2.000 cervejas (mais de 10 de barril) deve ter uma reacção com muito a ver com o êxtase sexual.
Depois é daqueles sítios onde quem nos serve, sabe, com certeza de cerveja, o que é uma vantagem, para o caso de querermos experimentar algo de novo.
O que não falta em Bruxelas são bares quase exclusivamente cervejeiros, quase todos com uma oferta invejável, em quantidade e qualidade. Mesmo assim, o Delirium Café é uma referência incontornável, e como se costuma dizer, “ir a Bruxelas e não visitar o Delirium, é o mesmo que ir a Roma e não ver o Papa.
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Acrescente-se que os prazeres do Delirium não se restringem ao paradisíaco
bar. Existem também as cervejas, duas delas bastante divulgadas por cá: a “Delirium Tremens” e a “Delirium Nocturnum”.
A apresentação das duas é bastante parecida e muito cuidada. A primeira é uma
semi-loura de espuma abundante, e que fervilha no copo com intensidade. De aromas e sabores frutados de baunilha, é uma cerveja com um amargo ligeiro no final. A sua “irmã” morena - a da foto - é mais encorpada, mas surpreendentemente para uma cerveja desta estirpe, torna-se bastante suave, pelo que a digestão se faz sem esforço. Aprazível, talvez seja a palavra.
Embora não sejam duas cervejas de excepção, são bastante agradáveis. O copo próprio é exemplarmente bonito, pelo que o prazer da degustação feita nele, certamente será acrescido.


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Nota Final: Por cá, de vez em quando, vê-se uma luzinha ao fundo do túnel. Mas lá muito ao fundo. E muito fraquinha.
Nos próximos dias 27, 28 e 29, o Goethe-Institut Portugal, promove a 2ª Oktoberfest. O preço de entrada é de 10€, que é depois deduutível no consumo. Lá estaremos, espero...


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posted by Vic at 9/25/2007 04:49:00 da tarde | 4 comments
domingo, 16 de setembro de 2007
Para os menos familiarizados com estas coisas da cerveja, Reinheitsgebot é, quando muito, um palavrão alemão. Mas não, trata-se da designação original da chamada lei da pureza da cerveja, imposta em 1516 pelo Duque Guilherme IV da Baviera, que ilegalizava outros produtos para além da água, cevada e lúpulo (o fermento ainda não era conhecido).
Ora esta lei, principalmente nas últimas décadas, tem sido bastante contestada e atirada ao lixo por inúmeros cervejeiros de todo o mundo. E embora alguns ainda a considerem como a regra sagrada na feitura da cerveja, quase excomungando os “infiéis” que ousem transgredi-la, a verdade é que a lei já não vincula ninguém.
Na minha opinião, trata-se de um fundamentalismo ultrapassado, e, como todos os fundamentalismos, nefasto. Nefasto principalmente, se fosse seguido por todos, no que concerne à evolução do panorama cervejeiro mundial, uma industria que todos os que elegem a cerveja como a “sua bebida”, querem dinâmica, nunca estática e sujeita a confinamentos de qualquer espécie.
Numa entrevista que Marcelo Carneiro, da Cervejaria Colorado, de Ribeirão Preto, dá ao Paulo Feijão em seu excelente blog,
à pergunta do Feijão:
Na Pilsen mandioca, na Weiss Mel e na India Pale Ale rapadura, é regionalização, produtos exclusivos ou redução de custos, qual é a grande sacada destas inovações?,
o Marcelo responde exemplarmente:
Boa pergunta, na verdade nos ultimos tempos eu vinha me questionando sobre a lei de Pureza que por mais de 10 anos segui. Não seria ela um limitante, um traquejo cultural germânico. Os belgas e americanos fazem tantas cervejas boas usando açucar, ninguém diz que é economia ou jogada de marketing.
Pois eu acho que podemos fazer uma boa cerveja com a nossa cara usando os nossos produtos e ainda por cima gente do mundo todo gostar, é possível e eu estou tentando fazer
“.
É claro que, à conta destas “liberdades” se têm feito muitos atentados ao paladar, mas a verdade é que, aparentemente cumprindo rigorosamente os preceitos da velha regra, aparecem produto sem quaisquer virtudes que os recomendem.
Não será verdade, que na qualidade dos ingredientes, no cuidado da produção, e principalmente no “amor à arte“ que estará o verdadeiro segredo?




 
posted by Vic at 9/16/2007 12:45:00 da tarde | 6 comments
domingo, 9 de setembro de 2007

Estas duas cervejas, vendidas em garrafas de 75cl, foram adquiridas com alguma apreensão da minha parte, uma vez que a primeira experiência com os produtos dos Brasseurs du Gayant, precisamente através da sua cerveja mais divulgada, a Biére du Demon, não se tinha revelado animadora. Na sua rotulagem afirmava-se ser a “loura mais forte do mundo” - o que não pode, por si só, ser tomado à conta de enorme virtude - e a verdade é que a degustação veio a provar-se desoladora.
No entanto, o preço muito acessível das garrafas, 2€ cada, foi preponderante na decisão de as comprar. Afinal, pensei eu, mesmo que não fossem nada de especial, o prejuízo não seria grande. E provou-se uma decisão acertada.
Ambas louras e medianamente fortes, muito bem apresentadas, com rótulos de belo design e informativos - onde constava que eram ambas brassée à l'ancienne- foram consumidas em dias consecutivos, facto que permitiu uma comparação, revelaram-se algo parecidas e bastante equilibradas.
A Saint Laudelin, cerveja de abadia, revelou-se bem apaladada, de sabor delicado a frutos e de fermentação, bem presente, apresenta uma gola branca persistente. O equilíbrio revela-se perfeitamente no facto de não sentirmos estar na presença de uma Strong Ale de 6,5%ABV.
Tal como a SL embora ligeiramente mais forte , a La Goudale, cerveja “de garde” e alta fermentação, é senhora de uma “cabeça” de espuma estável durante toda a degustação. A carbonatação é generosa, o sabor cidrado é notável, características que conjugadas a tornam uma cerveja de fácil ingestão.
São portanto, duas cervejas de consumo muito agradável, e que clamam por novas oportunidades. Das melhores cervejas francesas.

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posted by Vic at 9/09/2007 11:53:00 da manhã | 0 comments
sexta-feira, 7 de setembro de 2007
Durante esta minha breve ausência, surgiram notícias que me deixaram apreensivo. Só o tempo dirá da razoabilidade dos meus receios.
De que se trata? Da possível fusão entre a Centralcer e a Unicer. A confirmar-se a notícia, estaremos perante um quase monopólio no sector cervejeiro. E se é verdade que se mantêm algumas marcas de menor dimensão, estaremos perante o nascimento de uma super potência que manterá uma hegemonia indesejável no, já de si pobre panorama cervejeiro português.
É que, se com alguma concorrência as coisas pouco evoluem, e quando isso acontece, vão em sentidos completamente despropositados - mais uma vez faço notar que aqui exprimo as minhas opiniões pessoais e nada mais que isso - a não haver concorrência significativa, imagino que tudo se afunde numa profunda e vil tristeza.
Oxalá neste caso, a Autoridade para a Concorrência não deixe de actuar, indiferente a pressões.
De qualquer forma, mantenho a minha ideia de que, para haver uma evolução positiva neste campo, a solução passaria pelo desenvolvimento das micro-cervejarias, que são ainda muito poucas, sendo que as que existem, não parecem ter qualquer tipo de incentivos ou sequer beneficiarem de alguma publicidade. Serão meia dúzia de carolas que trabalham por amor à arte - um deles,um amigo alemão radicado na cidade de Braga -, e que habitualmente se vêm recompensados com…nada. Ou para ser mais justo, com os incentivos de alguns amigos que lhes fazem a chamada publicidade “boca a boca”.
Outra hipótese, será a da proliferação do homebrewing, que parece ganhar adeptos pelo país, apesar de ainda só existirem duas lojas - uma em Lisboa, a Loja da Cerveja Caseira, e outra em Coimbra - que se dedicam à divulgação e venda de material necessário para levar à prática este excelente hobby, do qual sou um admirador distante e nostálgico, uma vez que não me posso dedicar a ele por uma questão do logística. De qualquer forma, no caso da loja de Lisboa, o dono, um entusiasta e amante das virtualidades da cerveja caseira, já teve oportunidade de ver o seu estabelecimento e capacidades, divulgadas através da televisão, em dois programas distintos, o que poderá ser um sinal de alento para todos os que têm na cerveja, uma das suas paixões.
Espero bem que estas intervenções do nosso amigo e feliz proprietário da Loja da Cerveja Caseira, tenha aquelas consequências positivas que todos esperamos.


 
posted by Vic at 9/07/2007 02:54:00 da tarde | 4 comments