Ruivas, Louras & Morenas

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008
Nunca escondi o meu pouco apreço por aquelas cervejas deslavadas que, uns por uma questão de horizontes limitados, outros por alguma condescendência ou mesmo falta de exigência, consomem em doses industriais como se fossem água. Na verdade, sempre me pareceu supérfluo o tempo que se perde a beber uma cerveja sem carácter, e que pode ser substituída com vantagem, por uma boa água.
Em contrapartida, quando sou presenteado com uma daquelas que fazem a diferença, a minha satisfação é maior do que as palavras, escritas ou ditas, podem transmitir.
Com esta St. Bernardus 12, cerveja com que a Brouwerij S. Bernardus nos brinda, já me tinha defrontado num bar de Madrid, e embora já na altura se tenha demonstrado extremamente agradável, numa segunda experiência, desta vez em ambiente doméstico e degustada com outros cuidados, conseguiu surpreender.
De aromas e sabores apurados, líquido escuríssimo e turvo, com uma gola pouco persistente, densidade quase pastosa - cremosa talvez seja a palavra exacta - tem sem dúvida lugar cativo entre as grandes cervejas que se produzem por esse mundo fora.
Neste momento, distanciado já do dia em que tive o privilégio de a beber - em boas companhias, que é algo frustrante não partilhar estes momentos de prazer - creio que dar notas técnicas de degustação se torna quase que uma tarefa despicienda, até porque a complexidade desta cerveja a torna difícil de a deixar definida em palavras.

Já agora, e a título de curiosidade, uma vez que falei nas “melhores cervejas do mundo”, aqui deixo a lista das 10 melhores cervejas, segundo os apreciadores da Beer Advocate, uma das maiores e mais acreditadas comunidades cervejeiras do mundo virtual:
1º - Westvleteren 12 (10,2% Abv, quadrupel)*
2º - Dark Lord Imperial Stout (13% Abv, russian imperial stout)
3º - Kate the Great - Russian Imperial Stout (9,5% Abv, russian imperial stout)
4º - Pliny the Younger (11% Abv, IPA)
5º - The Abyss (11% Abv, imperial stout)
6º - Founders Kentucky Breakfast Stout (10% Abv, american double imperial stout)
7º - Westvleteren 8 (8% Abv, dubbel)*
8º - Darkness (10,3% Abv, russian imperial stout)
9º - Pliny the Elder (8% Abv, American double imperial IPA)
10º - Rochefort 10 (11,3% Abv, quadrupel)*

- assinaladas com um * as que já tive o prazer de conhecer.
- entre parêntesis o grau alcoólico e o tipo de cerveja.
Como mera curiosidade, a St. Bernardus 12 encontra-se classificada em 18º lugar. De referir também que na elevada percentagem de cervejas oriundas de cervejeiras norte-americanas, terá em certa medida a ver, com a predominância de americanos no painel de críticos da BeerAdvocate.
Por fim, de referir ainda a preferência demonstrada pela maioria pelas russian imperial stout e pelas quadrupel.
St Bernardus Abt 12 - **********

Cervejeira: Brouwerij St. Bernardus, Bélgica
Vol/Alc: 10,5% Abv
Ano: 2007
Tipo: Quadrupel
Copo: Goblet


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posted by Vic at 2/28/2008 03:57:00 da tarde | 0 comments
sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008
No que respeita á cerveja, um dos sítios mais interessantes a visitar em Amsterdam, é sem dúvida, a Brouwerij’t IJ (acho que se pronuncia T’eye, mas a língua holandesa é mesmo estranha). Trata-se de uma das micro-cervejeiras sobreviventes na cidade, e por curiosidade, acolhe-se à sombra de um majestoso moinho, o De Gooyer Windmill, também ele um dos últimos resistentes na cidade, e o mais central de todos, apesar de se situar um pouco desviado da habitual rota turística (mais precisamente, num local denominado Funenkade). Talvez por isso, a sua clientela é moderada em número, e esta será uma das causas para a, para nós estranha opção dos donos para o seu horário de abertura ao público, circunscrito entre as 15 e as 20 horas. A verdade, é que a denominação do sítio é Proeflokaal e não bar, o que talvez já elucide alguma coisa. Isto é, aquilo é mesmo uma micro-cervejeira, onde, durante um certo periodo do dia, se podem provar os produtos originais.
A ‘t IJ, que como emblema uma avestruz, animal estranho em tão nórdico país, fabrica um naipe notável de boas cervejas, umas de fabrico permanente e outras sazonais. Das primeiras, as únicas que tive o prazer de conhecer, destaco sobretudo a sua trippel, a Zatte e uma strong ale, se assim se pode chamar, a Columbus, qualquer delas, cervejas de grande carácter.


A solicitude das hospedeiras, com uma explicação detalhada dos seus produtos, e um convite para uma visita à cervejeira propriamente dita, que se situa atrás do balcão, foi bem demonstrativa da simpatia daquelas gentes, muito ao arrepio do preconceito do pouco calorosos que os povos nórdicos podem ser.
Mas deixando a ‘t IJ, tenho um par notas de viagem que podem ter algum interesse. A primeira é a de que, apesar da grande oferta que se encontra em qualquer bar - deixemos de fora a t’IJ uma vez que se trata de um local exclusivo - as cervejas à pressão têm natural ascendente sobre as de garrafa, e as que mais vi serem servidas, foram as Kwak - será que dá um prazer especial beber por aquele copo tão bizarro? - e as La Chouffe, o que dá bem ideia das preferências dos holandeses, isto apesar da quase omnipresença das gigantes Heineken e Amstel.
A segunda nota para a pouca oferta de acompanhamentos de degustação das cervejas, o que, a alguém ponderado, dá pouca hipótese de se alongar em “provas”, sob pena de facilmente se perder no caminho das pedras para o hotel.

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posted by Vic at 2/22/2008 09:10:00 da manhã | 3 comments
quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008
Antes do mais, dizer que a minha viagem a Amsterdam não terminou da melhor maneira, e que mais uma vez tive que reconhecer a minha pouca resistência aos fumos - embora a minha convivência com os fumadores seja pacífica, não podem é ser muitos ao mesmo tempo - e só esta semana me vi livre da infecção nas vias respiratórias que de lá trouxe, a par de algumas excelentes experiências cervejeiras, que isto a vida é como as moedas, e tudo tem o seu reverso.
Mas passemos ao que me traz hoje, um tipo de cervejas pouco divulgado por cá, para não dizer que é praticamente desconhecido, as Flemish Red, ou Flanders Red Ale.
Confesso desde já, que a minha primeira experiência com uma Flemish Red - nem me recordo que cerveja foi - não me agradou, e pensei até que a dita não estivesse nas melhores condições. É que estas cervejas caracterizam-se pela sua acidez, chegando mesmo a ter reminiscências avinagradas, o que, como é sabido, desagrada sobremaneira a qualquer um que se habitue a usar o vinho acidificado para temperar comida.
Mas ouvi falar tanto das virtudes de algumas delas, mormente das Rodenbach e da Duchesse de Bourgogne, que comecei a ponderar rectificar opiniões, e como tive acesso a esta última, decidi-me a nova prova. Em boa hora. Nesta cerveja da Brouwerij Verhaeghe, há um agridoce estranho mas agradável, que faz o palato percorrer uma variedade notável de sabores.
De cor rubi e espuma escassa, vertida no copo, a acidez vem de imediato ao olfacto, um aroma a cereja amarga, pouco madura. O sabor é suave, com a acidez sempre presente, mas muito mitigada por um adocicado muito característico, que deixa na boca uma mistura de sabores muito complexa, e dificilmente explicável.
Como o carácter alcoólico é moderado, esta é uma cerveja de muito bom beber, só ou acompanhando, por exemplo, um bom queijo de Serpa.
Uma experiência que vale a pena repetir.
Duchesse de Bourgogne - **********

Cervejeira: Brouwerij Verhaeghe, Bélgica, Flandres
Vol/Alc: 6,2% Abv
Ano: 2007
Tipo: Flemish Red
Copo: Goblet



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posted by Vic at 2/21/2008 03:18:00 da tarde | 2 comments
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008
Além das inevitáveis discotecas e livrarias, dois dos “vícios”, procuro encontrar nos destinos a que me desloco, lojas que vendam cerveja, e onde possa encontrar esta ou aquela raridade que por cá, nem cheirar.
E Amsterdam é sem dúvida, um dos locais que nunca deixará o “amador cervejeiro” de mãos a abanar.
A primeira destas lojas que visitei, foi a Cracked Kettle, um verdadeiro santuário cervejeiro, pertença de apaixonados pela divina bebida. Já tinha travado conhecimento com os donos, nomeadamente a dona, que tinha, há anos, estudado em Lisboa durante uns tempos dilatados. A lojinha - é uma pequena área, dividida em dois espaços desnivelados, e ambos superlotados pelas mais variadas e valiosas marcas de cervejas e copos em número considerável - que fica precisamente em frente ao Golem, de que já aqui falei, e à porta, bem estacionada, uma bicicleta destinada a entregas ao domicílio, cujo “cesto” da frente é…uma grade de Trappist Westvleteren. Melhor cartão de visita e convite à entrada poderia haver.
Gerido por gente simpática, tem, como disse, uma carta de cervejas invejáveis, não só as inevitáveis holandesas e belgas, mas também muitas das mais procuradas inglesas e mesmo escandinavas (as excelentes Nogne tinham lugar de destaque). E os preços, se exceptuarmos as Westvleteren, não são nada proibitivos. Mas se a variedade é um ponto forte, a simpatia demonstrada pelo pessoal, o seu interesse em informar o “passante”, foi o que realmente mais me impressionou. Nenhuma pergunta ficou sem resposta, e a conversa prolongou-se agradavelmente, dando-se graças por não haver mais clientes com quem dividir as atenções.

Como previa que, apesar de tudo, encontraria as Westvleteren a preços mais acessíveis na Bélgica, resumi as minhas compras a duas garrafas de 0,75cl, uma de Aardmonik e outra de Pannepot, ambas da cervejeira Struise, uma das mais notáveis da actualidade, e de que aqui falarei um dia destes.
A quem interesse, a Cracked Kettle, tem um belo site onde apresenta as novidades e faz vendas on-line em http://crackedkettle.nl/store/

 
posted by Vic at 2/11/2008 05:10:00 da tarde | 2 comments
sábado, 9 de fevereiro de 2008
É absolutamente natural, que ao rapazinho acabada a amamentação do terno leite materno, lhe agrade mais a doçura de um chocolate, do que o salgado de um bacalhau, seja confeccionado de que forma for. Depois, o paladar vai amadurecendo, ganhando estatuto de adulto, e cada coisa no seu lugar, tudo o que seja de qualidade é apreciado dependendo do momento. À medida que vamos ganhando idade, a vizinhança dos doces vai se atenuando e deixando de ter aquela importância quase transcendente de quando somos meninos.
Mas de quando em vez, lá vem aquela carência que o chocolate nos deixa, e corremos ao supermercado mais próximo, em busca de umas trufas ou de uma barra de Troblerone.
É então essa atracção fatal pelo chocolate, mesmo que ocasional, que me arrasta para esta Young’s Double Chocolate Stout. Bom…a fama também conta, e depois, se há tipos de cervejas que me são particularmente agradáveis, estas Milk/Sweet Stout são umas delas.
O guru Michael Jackson recentemente falecido, aconselhava a degustação desta cerveja a uma temperatura a rondar os 13º c. Mas sabe-se como por cá é apreciada bem mais fresca, e portanto, fugindo ligeiramente ao conselho, esta vinha a rondar os 8/10ºc. Espectacular gola, translúcida, cremosa e cor de caramelo, os aromas de chocolate bem nítidos a soltarem-se pelo ambiente.
E o sabor é fantástico, com o grão torrado a marcar presença, juntamente com o inevitável chocolate, que lhe foi acrescentado. A propósito, esta foi a primeira stout á qual se juntou chocolate, em barra ou essência, e a partir de então, muitas seguiram o (bom) exemplo. Continuando a degustação, que se mostra sempre agradavelmente sedosa, finaliza-se com um inevitável toque de chocolate negro amargo.
Experimente-se a acompanhar um brigadeiro, ou outra sobremesa qualquer.


Young‘s Double Chocolate Stout - **********

Cervejeira: Young & Co’s Brewery PLC, London, UK
Vol/Alc: 5,0% Abv
Ano: 2007
Tipo: Chocolate Stout; Milk/Sweet Stout
Copo: Pint glass


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posted by Vic at 2/09/2008 12:56:00 da tarde | 0 comments
quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008
Se há paraísos, para o apreciador de cerveja a Holanda, neste caso mais preciso, Amsterdam, será um deles.
Numa muito recente deslocação, pude verificar a verdadeira paixão que os holandeses nutrem pela bebida, muito semelhante à dos belgas, e da sua simpatia e disponibilidade para esclarecer as dúvidas do espantado viajante.
Iniciei a peregrinação pelo bar Golem, mesmo por trás da Damm. Antes de continuar, duas notas que ajudarão a compreender porque as minhas “aventuras” foram de certo modo condicionadas: a primeira, é que não bebo fora das refeições, abrindo raríssimas excepções. A segunda, é que o meu bem estar aconselha-me a evitar sítios frequentados por fumadores.
Ora o Golem, que não foge á regra dos restantes bares de Amsterdam, tem uma atmosfera saturadíssima, até porque se encontrava quase superlotado, e o recinto é escassíssimo. Penso mesmo que para os holandeses é impensável beber uma cerveja sem um cigarro a acompanhar. E de acompanhamentos para cerveja…nada. Pelo que tive abrir mesmo duas excepções aos meus hábitos, mas a perspectiva era irrecusável: o Golem, na sua extensa carta exposta em ardósias nas paredes e bem legíveis, exibia a Westvleteren 12, o maior mito cervejeiro da actualidade.


Quase incrédulo, perguntei ao barman, excepcionalmente simpático e interessado no esclarecimento de dúvidas, se tinha mesmo a West, ao quue ele respondeu de imediato: “Of course. Is on the board”. Pedi uma, e para a minha companheira, que é uma apreciadora de lambics, uma Liefmans Frambozen, a tal cerveja que corre risco de desaparecer, face á recente falência da cervejeira,
Claro que a West foi servida à temperatura ambiente, e a Liefmans, quase.
Mas deixem-me falar da West: só assistir à decantação é quase uma orgia: no copo original, uma espuma cremosa, de dois dedos, que não dura muito, e um corpo escuríssimo, profundo, com reflexos rubi.
Depois, a degustação que se revelou uma experiência do outro mundo: muito aromática, grande complexidade, com laivos de passas de uva, ervas aromáticas, caramelo. O sabor é consequentemente, também ele muito complexo, embora a certa altura nos pareça estarmos mais perante um licor que de uma cerveja, não fora a ligeira carbonatação. Suavíssima, uma agradável viscosidade que toma conta do palato, por onde espalha sabores a frutas doces, a citrinos e a mel. O alcool é perceptível, mas não se sobrepõe a tudo o resto, pelo contrário. Podem crer, o aquecimento do organismo é instantâneo.
Uma cerveja perfeita.


Westvleteren 12 - **********




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posted by Vic at 2/06/2008 12:46:00 da tarde | 5 comments