Há uns tempos, li com alguma perplexidade, uma afirmação de uma senhora que afirmava que a única vantagem que a idade lhe trouxera era o facto de as visitas á depiladora se terem tornado menos assíduos.
Bem, li na afirmação uma grande dose de ironia, sabendo que a idade traz muito mais coisas agradáveis. Uma delas, a multiplicidade de tons, aromas e sabores, que é o que agora vem ao caso. Quero dizer o quê? Como pode uma pós-adolescente citadino reconhecer, por exemplo, o odor da caruma se, reduzida a sua experiência de vida à selva de cimento, nunca caminhou por um pinhal ao entardecer? Como poderá distinguir o sabor da amora selvagem se nunca se aproximou dos espinhos agrestes de uma silva? Hoje, até me interrogo, se algum rapaz na casa dos vintes conhecerá sequer o verdadeiro aroma de um arroz de tomate à antiga ou da manteiga acabada de fazer.
Dito isto, acrescentaria que a riqueza da paleta de sabores e aromas que vamos guardando connosco, é do mais importante que colhemos na vida, para lá dos sentimentos ou emoções, também eles, indelevelmente ligados aos “nossos” gostos e cheiros. Na verdade, só reconheceremos um aroma, se já o tivermos um dia experimentado.
Uma das mais interessantes experiências para quem gosta de provar cervejas - tal como acontece com os escanções - é tentar descobrir todos e cada um dos aromas que se desprendem de uma cerveja acabada de abrir. E é uma tarefa difícil. Pelo menos para mim, que não sendo insensível ao cheiro, tenho ainda muito que aprender, ou por outra, muitos aromas para apreender.
Mas em relação a esta cerveja alemã da Schmucker, está longe de ser árdua a tarefa, tal a predominância dos maltes, mas sobretudo os aromas florais.
É uma cerveja de bonita presença no copo. Já a tinha experimentado antes e confirmou a primeira e positiva impressão. Bela espuma, intensa e cremosa, e o corpo rosado a confirmar o nome, e de carácter bem vincado, com os sabores firmes a frutas frescas, também as mesmas notas florais do aroma, e a gaseificação ajuda a torná-la mais leve - o que é extremamente positivo, tendo em vista a generosidade etílica e o facto de se tratar, como é hábito neste tipo de cervejas, em garrafa de meio litro - e muito agradável de beber.
Certamente, uma daquelas cervejas que muitos elegerão como das preferidas para as tardes estivais.
Cervejeira: Privat Brauerei Shmucker Ober-Mossau KG, Alemanha
Vol/Alc: 8% Abv
Ano: 2007
Tipo: Maibock/Helles Bock
Copo: Weizen Glass
A Cerveja para Principiantes (8) - Temperatura de degustação
Uma das questões que cava algumas divergências entre os apreciadores de cerveja, é a temperatura de degustação.
Parte-se do princípio que o “manual da degustação” está definitivamente saneado daquela “infame” norma que rezava que “cerveja, só estupidamente gelada”. Aliás, com a abertura de fronteiras, e a cada vez maior variedade de marcas e tipos de cerveja acessíveis no mercado, seria quase inevitável que esta pacífica e desejada invasão fosse acompanhada de diferentes “educações”.
Assim, a maior parte dos militantes cervejeiros interiorizou que, se uma lager servida acima dos 10ºC será pouco agradável, já uma trapista servida a baixa temperatura, será um atentado ao paladar e um crime de lesa-cerveja.
Contudo, ainda resta na comunidade cervejeira alguma polémica acerca das temperaturas ideais para consumo de cada cerveja, embora hoje já muitas aconselhem no seu rótulo a temperatura ideal da degustação, como a excelente trapista Orval, que recomenda os 12º/14ºC, o que para os hábitos portugueses é pouco menos que uma excentricidade, e que certamente fará rir ainda alguns “bebedores de minis”.
Ao ler alguns sítios, deparei-me com uma amplitude de temperaturas “aconselhadas” muito razoável, o que me deu uma ideia das tais divergências ainda existentes. Cheguei mesmo a ver transcrita a ideia peregrina que apontava o tom ou cor da cerveja, como directamente proporcional á temperatura ideal, ou seja, quanto mais clara, mais fresca deveria ser feita a degustação.
Ora foi face a tal situação que me decidi fazer uma consulta sobre o assunto numa das “bíblias” cervejeiras, a “Great Beer Guide - 500 Classic Brews”, do malogrado guru cervejeiro, Michael Jackson.
E embora as surpresas não fossem excessivas, achei curioso que a amplitude das temperaturas aconselhadas pelo inglês, fosse extremamente apertado, embora com excepções, a mais curiosa das quais será certamente, a para nós estranhíssima Liefmans Gluhkriek, que se deve beber como um “chocolate quente”, a 70ºC, e que, segundo a cervejeira, nos prepara devidamente para os rigores do Inverno
Mas na maior parte dos casos, a TI (temperatura ideal), varia, para MJ, entre os 9º e os 13ºC, sendo que as temperaturas mais baixas são obviamente indicadas para as Lager (mesmo as Dark Lager), as Bock ou as Weisse Beer, e as mais altas para a maioria das Abbey Ale, Stout ou Porter, sendo que nos dois últimos tipos, em alguns casos (em relação às Imperial Stout, sempre), Michael Jackson aconselha os 18ºC. Na maior parte das outras Ale considerava ele que é admissível abrir o leque entre os 10ª e os 13ºC.
No caso das trapistas, como no da já referida Orval, aconselha MJ o seu armazenamento a não menos de 14ºC e o seu consumo a nunca menos de 10ºC.
Naturalmente que para o amador cervejeiro, para além de que tudo isto depende do gosto individual de cada um, seria um preciosismo cumprir com estes parâmetros, nem sequer creio que seria essa a ideia de MJ.
Para o meu gosto pessoal, é evidente que uma boa dose de frigorífico é absolutamente indispensável a qualquer Pilsner (ou mais abrangentemente, qualquer lager) ou Weisse Beer. Tal como não faz sentido beber uma Hoegaarden Witbier ou uma DeuS que não esteja fresquíssima. E no caso da Guinness até discordo de MJ que lhe recomendava um consumo a TI dos 10ª aos 13ºC, porque a prefiro bem mais fresca.
Nos restantes tipos de cerveja, mesmo as Lambic, tenho o cuidado de as retirar do frigorífico uns bons 15 a 20 minutos antes de serem servidas, e no caso das Abbey Ale alargo um pouco esse espaço de tempo, tal como às Imperial Stout.
Depois, há aquelas que mal chegam a ter frigorífico: as barley wine e as trapistas, para as quais tenho um procedimento uniforme. Armazeno-as a temperatura ambiente e sem luz, e no Verão “dou-lhes” 5 a 10 minutos de frigorífico, só para as refrescar muito ligeiramente. No Inverno, sirvo-as à temperatura ambiente.
E sobre o assunto, aceitam-se contribuições.
Etiquetas: Schmucker Rosé Bock